28 de abril de 2010

Os indicadores da Política de Ciência e Inovação

"A mudança no modo como se "mede" a Política de Ciência e Inovação não altera os resultados que ela vem alcançando. Modifica apenas a percepção que a sociedade tem a seu respeito"

Rogério Bezerra da Silva é doutorando em Política Científica e Tecnológica pelo Departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências da Unicamp e pesquisador do Grupo de Análise de Políticas de Inovação da universidade. Artigo enviado pelo autor ao "JC e-mail":

No dia 22 de março foi realizado em Brasília o workshop "Nova Geração de Política Científica e Tecnológica", cujo objetivo foi uma discussão sobre as carências conceituais e metodológicas da Política Científica e de Inovação atual e encaminhar ações futuras que permitam suprir suas carências e levá-la a uma nova geração, como alude o título do evento.

Na divulgação do evento, além de artigos sobre o tema, escritos pelos palestrantes convidados, circulou um documento apresentado como Relatório Final, organizado pelo CGEE (Centro de Gestão e Estudos Estratégicos), o promotor do workshop, que destacava a importância daquela discussão.

Questionava esse documento já na abertura: "O que ocorre de importante no ambiente de inovação que os indicadores tradicionais não mostram? É aceitável a idéia de que as empresas brasileiras sejam mais inovativas do que revelam os indicadores?". O documento destaca que a resposta a elas deve incluir inovações do setor terciário, ou de serviços, o que até então não era feito nos estudos anteriores.

Cabe aqui a nossa indagação: mas, o que os indicadores convencionalmente usados vêm mostrando sobre a dinâmica inovativa no Brasil? Ela pode ser respondida recorrendo-se a seis fatos estilizados, elaborados a partir de indicadores das Pintecs (Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica, do IBGE) de 2000, 2003 e 2005 e de dados de trabalhos acadêmicos sobre inovação no Brasil.

O primeiro deles, mostra que há uma baixa intensidade tecnológica da indústria brasileira. A intensidade de P&D média da indústria nacional foi de 0,64% em 2000, 0,53% em 2003 e 0,77% em 2005. Dados da OCDE indicam que a intensidade de P&D das indústrias dos 12 países que a compõem foi em média de 2,5% entre 1990 e 1999.

O segundo, a baixa capacidade de absorção de pessoal pós-graduado pela empresa privada. No Brasil são formados anualmente cerca de 30 mil mestres e doutores nas áreas de "ciências duras" e engenharias. Número que cresce a uma taxa de 10% ao ano. Porém, as empresas - privadas e públicas - localizadas no país possuem apenas 3 mil mestres e doutores atuando em atividades de P&D. Caso esse estoque de mestres e doutores nas empresas apresente um aumento de 10%, no ano seguinte haveria uma demanda adicional de 300 mestres e doutores para uma oferta de 30 mil.

O terceiro, a baixa capacidade de utilização do potencial científico para a inovação tecnológica. Enquanto que em 1980 o Brasil publicava cerca de oito vezes mais artigos científicos que a Coreia do Sul, em periódicos indexados, em 2000 este último país superou o Brasil, publicando 1,25 vezes mais artigos científicos. O Brasil passou de 1.900 para 9.500 artigos; e a Coreia de 230 para 12.200 artigos científicos em periódicos indexados. Embora o Brasil tenha tido uma evolução inferior à da Coreia, os dois países foram os que mais aumentaram sua produção científica entre 1980 e 2000.

No plano tecnológico, em 1980 o Brasil superava a Coreia em número de patentes concedidas pelo USPO (United States Patent Office) dos EUA. Nesse ano o país tinha 28 patentes concedidas e a Coreia apenas 8. Todavia, em 2004 a Coreia já havia se tornado um dos grandes patenteadores, chegando à quinta colocação do ranking mundial. Nesse ano, o Brasil estava na última colocação.

O quarto, a propriedade estrangeira das empresas de maior intensidade tecnológica e sua baixa propensão a inovar. Em relação às suas matrizes, é relativamente pequeno o esforço tecnológico das filiais das empresas estrangeiras localizadas no Brasil. Observando cinco setores industriais brasileiros com maior participação estrangeira, se constata que os esforços tecnológicos das filiais são 70% menores do que os da matriz no segmento farmacêutico, 10% no de máquinas e equipamentos, 60% no de materiais e equipamentos eletrônicos, 31% no de instrumentos médicos, óticos e de precisão e de 62,5% no de veículos automotores e autopeças.

O quinto, a baixa capacidade de captação de recursos pelas instituições de P&D via contratação de projetos de pesquisa com a empresa privada. Das universidades públicas de São Paulo, a Unicamp possui 1% de sua receita anual proveniente de contratos com empresas privadas. Estando ela entre as maiores instituições de P&D públicas do país é razoável supor que o potencial de captação de recursos privados pelo conjunto das universidades e institutos de P&D brasileiros é muito menor do que o observado em países como os EUA, que é de 1,1%.

A criação de outros indicadores para a Política, incluindo aqueles sobre o setor de serviços, nos remete a uma metáfora: a velocidade máxima de seu carro em uma reta é de 100 Km/h e, por isso, você o considera lento. Você busca alguma solução para esse problema. Pede ao mecânico que substitua os instrumentos de medição da velocidade, principalmente o velocímetro, por outros que indiquem até 200 Km/h. Assim, na reta, quando o carro atingir sua velocidade máxima, o velocímetro indicará 200 Km/h, mesmo que não tenha sido feita qualquer alteração no motor.

A mudança no modo como se "mede" a Política de Ciência e Inovação não altera os resultados que ela vem alcançando. Modifica apenas a percepção que a sociedade tem a seu respeito.

Nenhum comentário:

Postar um comentário