31 de maio de 2010

O risco nas pesquisas


TOMAZ LANGENBACH

Criar um genoma artificial e viabilizar sua reprodução certamente é um grande feito científico. Toda tecnologia nova de grande potencialidade em benefícios trás consigo possíveis riscos indesejáveis. Preocupado com isto, o cientista Craig Venter propôs nova legislação de controle. A história de usos e maus usos de tecnologia coloca a pergunta se é possível controle eficiente? O desenvolvimento tecnológico é, sobretudo, determinado pelos interesses econômicos, como a obtenção de patentes que monopolizam tecnologias, interesse explicitado por Venter.

Vivemos hoje numa "sociedade de risco" em que a sociedade responde reativamente e por isto tardiamente com muitas dificuldades as consequências negativas dos avanços tecnológicos. A aplicação de novas tecnologias até agora sempre ocorreu antes da identificação ampla dos seus efeitos negativos. A legislação de controle é posterior, e países como os EUA só permitem restrições com provas científicas dos malefícios enquanto outros, como o Brasil, consideram o conceito de precaução restringindo o uso de tecnologias enquanto há dúvidas.

Os riscos das novas tecnologias podem ser parcialmente conhecidos com cenários utilizando-se experiências anteriores com situações similares. Mesmo assim abriga incógnitas geralmente minimizadas ou ignoradas para o emprego mais rápido das inovações.

Uma das preocupações é a falta de legislação de controle antes do uso comercial do produto como é exigido com os agrotóxicos. As nanomoléculas estão sendo produzidas com toda a liberdade sem passar por controles antes de sua comercialização. Os sólidos dados científicos que geram novas tecnologias geralmente não são acompanhados com a mesma preocupação, com o conhecimento dos desdobramentos sociais e ambientais condicionados a grande número de variáveis.

As mudanças climáticas, decorrentes da queima de combustíveis fósseis em larga escala há mais de um século, eram desconhecidas até 20 ou 30 anos atrás. Nos anos 40 introduziram-se os agrotóxicos, e só recentemente verificouse que muitos destes produtos atuam sobre os hormônios. Muitos efeitos precisam de longo período para ser percebidos.

A legislação de controle é formulada mais rapidamente quando os problemas são claramente detectados pela ciência e é retardada quando há evidências científicas contraditórias, como aconteceu na discussão sobre o aquecimento global. A diversidade de legislação - muitos países não têm legislação - permitiu que a pesquisa com células-tronco se desenvolvesse mais nos países sem restrições. Assim, a pesquisa não é controlada em escala mundial porque se desloca geograficamente.

Melhor seria liberar o desenvolvimento científico com exceção de situações limites como clones humanos, ganhando em contrapartida mais informações necessárias ao seu controle.

O respeito à legislação de controle é relativo. No Brasil, a experiência com a ilegalidade mostra as dificuldades em coibi-la. Há grupos radicais de seitas ou ativistas de contestação política interessados em tecnologias a serem utilizadas para seus fins. Os exércitos são interessados em desenvolver tecnologias para uso em guerras químicas ou biológicas. Com o tempo, o acesso a estas tecnologias torna-se mais fácil, além do risco de serem pirateadas em centro de pesquisas.

Outro problema é o vazamento acidental permitindo a contaminação ambiental. Como precaução, o desenvolvimento de vida artificial deve ficar confinado, e mesmo assim sabese que é difícil evitar vazamentos.

Os interesses de desenvolver tecnologia de "vida artificial" para fins de saúde, e outros, como energia, vão se sobrepor aos seus riscos. Portanto é imprescindível pesquisar todos os riscos, incluindo aqueles apresentados por grupos de contestação na elaboração da melhor legislação de controle possível. A experiência mostrou que a pesquisa dos riscos é mais extensa e demorada do que o desenvolvimento tecnológico. Assumir riscos no uso de tecnologias destinadas ao nosso bem-estar deveria ocorrer somente quando pudermos reduzi-los ao máximo, apesar de sabermos que não serão eliminados

O Globo


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