23 de abril de 2012

Aumento de suicídios por causa da crise angustia a Europa


Folha de São Paulo/The New York Times 
Por ELISABETTA POVOLEDO e DOREEN CARVAJAL
TREVISO, Itália - Antonio Tamiozzo, 53, enforcou-se na véspera do Ano-Novo no depósito de sua construtora nas proximidades de Vicenza, depois de vários devedores não terem lhe pagado.
Três semanas antes, Giovanni Schiavon, 59, de Pádua, se matou com um tiro na cabeça. Confrontado com a perspectiva de ordenar demissões no Natal na firma que é de sua família há duas gerações, deixou um bilhete: "Me desculpem. Não suporto mais."
A recessão econômica que abala a Europa há três anos levou a um aumento alarmante no índice de suicídios. Especialmente nos países mais frágeis, como Grécia, Irlanda e Itália, vêm aumentando as chances de pequenos empresários e empreendedores se matarem, num fenômeno descrito por alguns jornais como "suicídio por crise econômica".
Embora alguns países demorem a informar estatísticas, e os legistas -para proteger os sobreviventes- relutem em classificar mortes como suicídios, está claro que os países na linha de frente da crise econômica são os mais atingidos.
Na Grécia, o índice de suicídio entre homens aumentou mais de 24% entre 2007 e 2009. Na Irlanda, no mesmo período, houve um aumento de mais de 16% nos suicídios de homens. Na Itália, os suicídios motivados por dificuldades econômicas subiram de 123 em 2005 para 187 em 2010.
Especialistas dizem que a tendência está se intensificando este ano, à medida que os governos implementam medidas de austeridade.
"A crise financeira coloca em risco a vida de pessoas comuns, mas é muito mais perigoso quando são feitos cortes radicais na proteção social", disse David Stuckler, sociólogo da Universidade Cambridge que liderou um estudo publicado no "Lancet" que constatou um aumento acentuado nos suicídios na Europa entre 2007 e 2009, especialmente na Grécia e na Irlanda. "A austeridade pode converter uma crise em uma epidemia", afirmou.
Cientistas sociais afirmam que alguns países, como Suécia ou Finlândia, evitaram um aumento nos índices de suicídio porque, em vez de fazer doações de dinheiro, investiram em iniciativas para ajudar as pessoas a se recolocarem em pé.
A região italiana de Vêneto vem sendo especialmente atingida. Mais de 30 pequenos empresários daqui cometeram suicídio nos últimos três anos, durante os quais a região sofreu uma queda nas encomendas industriais, a concorrência da China e o arrocho do crédito bancário. Mais recentemente o fenômeno vem se espalhando para Bolonha, Catânia e Roma.
Na Irlanda, os suicídios são vinculados à chamada "depressão do tigre celta" do período pós-2008, após o ciclo de "boom e bust" (expansão e crise) do mercado imobiliário.
Pesquisadores em Cork que entrevistaram familiares de 190 pessoas que cometeram suicídio entre 2008 e março de 2011 constataram que as vítimas foram em sua maioria homens, com idade média de 36 anos. Quase 40% estavam desempregados e 32% trabalhavam na construção.
De maneira geral, eles enfrentavam uma constelação de problemas: dificuldades financeiras, desemprego, relacionamentos rompidos e solidão.
Na Itália, às vezes é o governo que não paga suas dívidas com empresários em dificuldades. A legislação nacional que visa limitar os gastos públicos vem levando administrações estaduais e municipais a acumular bilhões de dólares em contas não pagas a credores, com isso dificultando a vida de muitas pequenas empresas.
"Esta é a loucura desta crise: que as pessoas se matam porque não foram pagas por instituições públicas", disse Massimo Nardin, porta-voz da Câmara de Comércio de Pádua.
"O problema é o sistema, ninguém mais está pagando: privado, público, tudo está bloqueado", falou Salvatore Federico, secretário-geral de um sindicato local de trabalhadores na construção.
Alguns atribuem os suicídios ao enfraquecimento dos laços religiosos. "O trabalho virou a religião aqui. Com o tempo, isso foi enfraquecendo a família, porque se você só faz trabalhar, trabalhar, quando o trabalho falha você não tem mais ao que recorrer", disse o padre Davide Schiavon, que dirige a seção de Treviso da organização católica Caritas.
Grupos comunitários e entidades beneficentes procuram oferecer alguma ajuda. Linhas telefônicas do tipo "SOS suicídio" são divulgados em postos de gasolina e personalidades vêm falando em público sobre o assunto.
No dia 26 de abril o baixista do U2, Adam Clayton, vai levantar dinheiro para serviços gratuitos de saúde mental com um dia nacional de solidariedade. George Mordaunt, 44, de Clonmel, Irlanda, pensou em cometer suicídio quando sua revendedora de carros faliu. Acabou por fundar um serviço de apoio que oferece aconselhamento a pessoas em situações semelhantes.
Elisabetta Povoledo escreveu de Trevis e Doreen Carvajal de Laharane, na Irlanda

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