2 de abril de 2012

Cortes na cultura abalam a Europa


Por LARRY ROHTER
DIANTE DE problemas econômicos e da necessidade de austeridade, governos europeus estão reduzindo o apoio que dão à cultura, forçando instituições de arte a reduzir programas e turnês.
Na Itália, o mundialmente famoso teatro de ópera La Scala enfrenta um deficit de US$ 9 milhões devido à redução de seus subsídios. Na Holanda, o financiamento do governo para programas artísticos foi cortado em 25%. Portugal aboliu seu Ministério da Cultura.
Com isso, algumas companhias e orquestras vêm enxugando suas produções e tentando levantar verbas junto a doadores privados. Em muitos casos, elas agora estão buscando conselhos com as instituições americanas com as quais já têm laços há muito tempo.
"Posso lhe dizer que todas as instituições estão comentando o fato de seus governos lhes estarem dizendo que terão que adotar o modelo americano", falou Joseph V. Melillo, produtor da Brooklyn Academy of Music. "Mas não existe tradição de filantropia individual em muitas dessas culturas, de modo que faltam a elas tanto a motivação quanto os incentivos fiscais para fazerem doações."
Para artistas e administradores na Europa, as mudanças são perturbadoras, até mesmo revolucionárias.
A Europa vê a cultura não como uma commodity, algo em que as forças de mercado determinam quais produtos sobrevivem ou não, mas como um legado comum a ser alimentado e protegido, mesmo no caso dos gêneros artísticos que podem não agradar ao grande público.
"A cultura é uma necessidade básica", disse Andreas Stadler, diretor do Fórum Cultural Austríaco em Nova York e presidente da filial na cidade dos Institutos Nacionais de Cultura da União Europeia. "As pessoas devem ter o direito de assistir à ópera."
A Alemanha e a França -as maiores e mais estáveis economias da Europa- estão sofrendo menos que outros países e podem até apontar para aumentos nas verbas de alguns programas, gêneros e grupos artísticos que promovam a imagem dos países no exterior. É o caso das produções de cinema.
Mas outros países, cujos governos são liderados por conservadores ou tecnocratas -como a Itália, a Hungria, a Holanda e o Reino Unido- tiveram seus orçamentos culturais cortados. A mesma coisa aconteceu com outros --Grécia, Portugal, Espanha e Irlanda-- que estão sendo forçados a reduzir seus gastos públicos para permanecerem na zona do euro.
No caso da Holanda, o orçamento de cultura será reduzido em aproximadamente US$ 265 milhões (25%) até o início de 2013 e os impostos sobre ingressos para eventos culturais devem subir de 6% para 19%, embora cinemas, eventos esportivos, zoológicos e circos estejam isentos. O secretário de Estado da Educação, Cultura e Ciência, Halbe Zijlstra, disse que o que se busca é "mais que a qualidade -uma nova visão da política cultural", na qual as instituições tenham que justificar economicamente o que fazem e competir pelas verbas limitadas.
Isso quer dizer que o peso maior dos cortes projetados recairá sobre companhias menores, especialmente as que fazem trabalhos experimentais e de vanguarda. Instituições grandes e consolidadas, como o Rijksmuseum, o museu Van Gogh, a orquestra Royal Concertgebouw e o Balé Nacional Holandês, estão mais bem posicionadas para se sustentar.
"A economia não está mais tão boa. Para conseguir apoio é preciso ser uma companhia grande, com reputação internacional", explicou Michael Nieuwenhuizen, gerente de projetos internacionais do Centro Musical Holandês. "Além disso, o governo quer ver uma boa relação custo-benefício e vincula isso aos mercados; portanto, se você tiver um público, será recompensado."
A consequência disso, ele acrescentou: "Vamos perder alguns corais e algumas orquestras".
De acordo com Sophie Lambo, diretora gerente do Internationaal Danstheater, de Amsterdã, no campo da dança "vai ser um tsunami".
A crise está afetando o tipo de arte que é apresentado e como é feito. Nigel Redden, diretor do festival de arte do Lincoln Center, de Nova York, disse que parece estar crescendo na Europa a tendência à criação de obras novas com menos personagens ou instrumentistas. "Muitos dramaturgos estão escrevendo peças para três atores em vez de oito e um compositor pode se ver compondo para um grupo de câmara, não para uma orquestra sinfônica", explicou.
Em Nova York, as instituições de arte europeias estão procurando espaços menores e menos caros para exibições. "Por que gastar tanto com o Carnegie Hall quando há espaços mais baratos disponíveis?", opinou um organizador de intercâmbios culturais.
Outros se esforçam para estreitar laços com instituições americanas. No ano passado, o Festival de Cinema Romeno foi apresentado no Lincoln Center, com o co-patrocínio da Sociedade de Cinema do Lincoln Center.
"Comparados com o que fazíamos cinco anos atrás, hoje já não pensamos em fazer as coisas sozinhos, por conta própria", disse Corina Suteu, do Instituto Cultural Romeno. "De repente, é preciso tornar-se criativo, é preciso buscar parceiros, quer sejam americanos, europeus ou até de outros continentes. Eu estou fazendo isso. Todos meus colegas estão fazendo a mesma coisa."
Algumas instituições de arte europeias começaram a procurar apoio financeiro nos Estados Unidos, cortejando empresas americanas ou indivíduos americanos ricos que tenham laços emocionais com os países de seus antepassados. Mas, como reconheceu Stadler, isso significa "que estamos competindo com instituições americanas, que também foram duramente atingidas".
Muitos temem que o impacto dos cortes afete de modo permanente todas as etapas do processo artístico, da criação ao consumo. "Em vez de apresentar Brian Friel, talvez apresentemos Noel Coward, pensando na bilheteria", disse Redden.
"Algumas dessas trocas são inevitáveis, mas acho que, se o teatro contundente deixar de ser apresentado em favor das comédias bem comportadas, isso será devastador. Ainda não chegamos a isso, mas não há dúvida alguma de que está ocorrendo um movimento de revisão e adaptação."

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