13 de abril de 2012

Moisés Naím - As cúpulas já não são o que eram


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Os culpados pelo atraso em seus países são alguns dos chefes de Estado que fazem discursos incandescentes 


DUAS CÚPULAS: Yalta, 1945, e Cartagena de Índias, 2012. Da primeira participaram três chefes de Estado, da segunda participarão 33. Na primeira, Stálin, Churchill e Roosevelt tomaram decisões que afetaram centenas de milhões de pessoas diretamente e por décadas. Não parece que em Cartagena serão tomadas decisões que afetem a maioria dos cidadãos deste hemisfério.

De certo modo, isso é bom. Nenhum dos presidentes que estão em Cartagena, nem sequer Barack Obama, concentra tanto poder quanto os três líderes que se reuniram em Yalta. O grau em que o mundo mudou se evidenciou ainda mais para mim ao ler uma poética nota oficial dos organizadores, explicando o desenho gráfico desta cúpula: "O beija-flor voa rápido e chega muito longe. Talvez seja a única espécie do reino animal que atravessa o continente com uma técnica impecável de voo... denominador comum dos países do hemisfério, desde o Alasca até a Patagônia. Por todas essas razões a figura de um beija-flor de asas multicoloridas foi escolhida como o logotipo da cúpula".

Dá para imaginar a reação de Stálin ou Churchill ao ler algo como isso? Sim, é um mundo diferente.
Por outro lado, é justo reconhecer que a agenda oficial desta cúpula é muito promissora. Os chefes de Estado estão discutindo sobre pobreza e desigualdade, desastres naturais, tecnologias da informação, segurança dos cidadãos e a integração física das Américas.

São todos temas muito válidos, sobre os quais é urgente agir rapidamente e bem. Mas há dois detalhes importantes. O primeiro é que não é preciso uma cúpula para avançar nessas questões. Há muito que os países podem fazer por conta própria; de fato, alguns evidenciam grandes avanços. Mas os que continuam parados não estão em função de seus vizinhos. Os culpados pelo atraso são alguns dos chefes de Estado que fazem discursos incandescentes na cúpula.

O segundo detalhe é que o que atrai mais atenção não são estes temas prioritários, e sim outros sobre os quais ninguém espera que aconteça muita coisa: drogas e Cuba.

Com relação às drogas, há uma boa notícia que se deu independentemente da cúpula: 2012 vai passar para a história como o ano em que se jogou por terra a proibição de pensar em alternativas à política antidrogas imposta pelos EUA.

Isso não quer dizer que se vá abandonar uma política que evidentemente fracassou. Mas significa que agora é permitido explorar outras possibilidades; que isso aconteça na cúpula é um sinal de progresso. E depois há Cuba.

Vários presidentes estão furiosos porque Cuba não é convidada para participar na Cúpula das Américas. O fato de que esta cúpula é apenas para países democráticos é, para eles, um detalhe irrelevante.
O que os temas Cuba e drogas têm em comum? O fato de que ambos permitem desviar a atenção de suas próprias deficiências e voltar os refletores para os EUA.

Para que falar da repressão em Cuba, da liberdade de imprensa no Equador, do populismo argentino ou da militarização da Venezuela se podemos falar dos EUA?
 
@moisesnaim

Tradução de CLARA ALLAIN

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