2 de abril de 2012

O motivo da nota baixa na sala de aula



A falta de qualificação dos professores é um dos fatores responsáveis pelo mau desempenho dos alunos
01/04/2012 - 21h33 - 
A Gazeta



Jorge Werthein
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Priscilla Thompson
ppessini@redegazeta.com.br


"O problema é que o ensino de ciências não é prioridade no Brasil.”

Jorge Werthein
Especialista em Educação e ex-diretor da Unesco

A última edição do Programa de Avaliação da Educação Básica do Estado, o Paebes, revelou uma situação que há décadas preocupa o país: nossos alunos estão saindo do ensino médio sem saber o mínimo esperado nas disciplinas da área de ciências, ou seja, em Biologia, Química e Física.
Outras avaliações de larga escala no Brasil também têm mostrado, a exemplo do Paebes, que nessa área os estudantes têm o pior desempenho, se comparado com as disciplinas de Matemática e Português. E não importa se estamos falando da rede pública ou particular.

A diferença entre elas é pequena, com uma ligeira vantagem para a escolas privadas. Mas, afinal, por que continuamos "engatinhando" quando o assunto é o desenvolvimento das ciências, dentro e fora da escola?

Entre os fatores que explicam o mau desempenho dos alunos está a falta de qualificação dos professores que atuam na área. Em todo o país, apenas 4% dos profissionais que dão aulas na educação básica têm formação superior em ciências. No Estado, uma média de 50% deles também não é formada na disciplina para a qual dá aulas. É comum termos, por exemplo, professores de Matemática dando aulas de Física ou enfermeiros ensinando Biologia, explica o secretário Estadual de Educação, Klinger Barbosa Alves. Isso quando não há alunos de graduação dando aulas para alunos do ensino básico ou quando o professor não tem formação nem mesmo em áreas correlatas.

A situação porém, é consequência de uma outra: a falta de interesse dos alunos que saem da educação básica por esses cursos de graduação, que têm como principal função formar, justamente, futuros professores. E logo vemos um ciclo vicioso se formando, conforme explica o especialista em Educação e ex-diretor da Unesco, Jorge Werthein. "O problema é que o ensino de ciências não é prioridade no Brasil. Não há políticas públicas efetivas que incentivem a realização de pesquisa e que valorizem o desenvolvimento de conhecimento na área. Com isso, as ciências acabam sendo vistas por alunos e até mesmo pelos professores como algo difícil, distante da nossa realidade. E se não formamos bons professores, também não vamos formar bons alunos, e história vai se repetindo", diz.

Pouca pesquisa

Para Werthein, vivemos uma contradição "complicada" ao sustentarmos a 6ª maior economia do mundo e ocuparmos a 53ª posição quando o assunto é o ensino de ciências – segundo o ranking composto por 65 países que participaram do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), em 2009. "Estamos deixando de formar futuros pesquisadores, peças fundamentais para o desenvolvimento tecnológico, social e econômico de um país. Está comprovado que investir em educação e em conhecimento científico tem um retorno muito alto, mas não estamos fazendo bem esse papel", defende.

Os dados mais recentes do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação mostram que, em 2008, o Brasil investiu cerca de U$ 24 mil em pesquisa e desenvolvimento. O valor representa pouco mais de 1% do Produto Interno Bruto (PIB), muito pouco perto do que países como Estados Unidos e o Japão investem. No Japão, referência em inovação e na área de tecnologia, o gasto em pesquisa ultrapassou U$ 148 mil, em 2007, o equivalente a 3,4% do PIB.

O número de pesquisadores no Brasil também é menor quando comparado ao de outros países. Enquanto aqui existem cerca de 1,4 pessoas dedicando-se à pesquisa em tempo integral para cada mil trabalhadores, na vizinha Argentina são a taxa é de 2,9. Já nos Estados Unidos, o número salta para 9,5.

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Salas vazias

A procura por cursos superiores nas áreas de ciências é extremamente baixa no Brasil. Além disso, dos alunos que ingressam nos cursos de Física, Química e Biologia, poucos são os que concluem a formação. Na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), por exemplo, cerca de um terço das vagas oferecidas nessas três graduações, juntas, são abandonadas todo ano. Em Física, aproximadamente 60 alunos, por ano, deixam o curso ou são reprovados. Há casos, também, de pedidos de transferência para outros cursos ou para outras instituições. A melhor situação é do curso de Biologia, onde a desistência é de apenas 12 por ano, em média, para cada 70 vagas abertas.

A gerente de formação da Sangari Brasil e júri do prêmio Educador Nota 10 na área de ciências, Luciana Domingos Hubner, defende que esse cenário é mais uma consequência da falta de incentivo à pesquisa no Brasil e da ideia que se reproduz nas salas de aula de que ciências é algo difícil de ser aprendido. "Isso acontece porque as didáticas das ciências são muito novas. Enquanto que a didática da Língua Portuguesa é estudada desde a década de 80, a de ciências só começou a ser estudada em meados da década de 90. Ou seja, ainda sabemos muito pouco a respeito de como o aluno aprende ciências", explica.

Por isso, independente da área de formação, o professor certamente terá dificuldades para ensinar. "Ele acaba reproduzindo a didática tradicional, que tem uma visão ‘enciclopédica’ e focada apenas no conteúdo, e não na investigação das questões da ciências", diz. Para ela, um dos maiores erros da escola é, justamente, desconstruir a curiosidade do aluno – característica fundamental para quem quer aprender a pesquisar.

"Nas séries iniciais do ensino fundamental, o aluno ainda tem mais curiosidade e pergunta mais. Depois, a escola vai ensinando para ele que as perguntas têm que ter, sempre, uma resposta certa. As perguntas deixam de servir para ajudar o aluno a pensar e passa a servir apenas para medir o que ele sabe sobre o assunto. A mola propulsora da aprendizagem é justamente a curiosidade", diz.

Soluções

Para quebrar esse ciclo vicioso, Werthein aposta no envolvimento de Estados e municípios na criação de estratégias que valorizem o ensino de ciências. "Não temos que esperar solucionarmos todos os outros problemas da educação para, só depois, nos preocuparmos com as ciências. Elas são prioridade. Vamos implementar um ensino criativo, reflexivo e interativo, de fato, e investir na atualização dos nossos professores", convida.

Segundo o secretário Estadual de Educação, Klinger Barbosa Alves, iniciativas como essas já estão sendo implementadas na rede estadual, que atende, principalmente, ao ensino médio. "Estamos oferecendo programas de formação continuada para os professores efetivos, incentivando o envolvimento deles com pesquisa e criando novos laboratórios", cita. Este ano será aberto novo concurso para professores da rede estadual. No último concurso, realizado no ano passado, foram contratados 21 professores de Biologia, 76 de Física e 69 de Química. "Os índices não vão mudar de um ano para o outro, mas temos que dar os primeiros passos", justifica o secretário.
Ações da Sedu

Equipamentos

Laboratórios de ciências

Existem em 159 escolas de ensino fundamental e médio da rede estadual. Até 2014, também serão implantados em todas as 284 escolas de ensino médio. O investimento é de cerca de R$ 25 milhões

Didática

Apostilas

A partir de cursos de formação continuada de professores, realizados no ano passado, a rede elaborou cadernos de práticas experimentais em Física e cadernos temáticos em Ciência, Tecnologia e Sociedade, que vão contribuir para o ensino na sala de aula

Guias

Este ano, também serão elaborados guias de intervenção pedagógica em Química, Física e Biologia para as escolas

Exposições

Em junho, está prevista a realização da exposição científica “Revolução Genômica e Corpo Humano”. A expectativa atrair cerca de 50 mil estudantes da rede estadual 

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