21 de abril de 2012

Privatização x parceria: a importancia da pesquisa



Folha de Sãp Paulo, 21 de abril, 2012


Com parcerias, as empresas de pesquisa ganham capacidade para competir com as empresas privadas
Nas últimas semanas, algumas matérias sobre a Embrapa foram veiculadas pela mídia, colocando em discussão a modernização de nossa grande e respeitada instituição de pesquisa, e tratando de um projeto de lei do Senado para a abertura do capital da empresa, a exemplo da Petrobras e do Banco do Brasil.
Também veio à baila a questão da pesquisa pública x pesquisa privada: qual das duas é mais eficiente? Vamos por partes.
Em primeiro lugar, BB e Petrobras são empresas que devem ter lucro: seus acionistas precisam ser remunerados por investirem nelas.
Uma empresa privada de pesquisa pode ter o mesmo desiderato, o que está certo. No entanto, é possível que, em razão disso, a pesquisa da empresa privada privilegie os cultivos mais importantes para o mercado. Faz todo o sentido colocar atenção em produtos como a soja, o milho e o algodão, cuja força mercadológica é grande, e nem tanto em produtos sem expressão comercial. É claro que o país todo lucrará com ganhos de produtividade nas grandes culturas, uma vez que estas ficam mais competitivas, avançam sobre mercados externos, geram emprego, renda, riqueza e excedentes exportáveis
Tudo isso é desejável, mas a empresa pública de pesquisa tem outros objetivos. Entre eles, a conservação da biodiversidade, de bancos de germoplasma, a avaliação do potencial de recursos genéticos, estudos sobre pragas e doenças ainda não existentes no país e que podem vir a ocorrer etc.
A pesquisa pública trata de temas de longo prazo, serve para aumentar o estoque do conhecimento, o que ajuda a aprimorar teorias e parâmetros científicos no país. Não há preocupação de lucro com a pesquisa, mas sim lucro para seus usuários. Com isso, quando o risco de fracasso é alto, só a pesquisa pública pode investir.
Portanto, é fundamental que existam empresas públicas na área da pesquisa agrícola. O que seria do agro brasileiro sem o Instituto Agronômico de Campinas, o Biológico, o Pesca, o Florestal, o Instituto de Zootecnia, as universidades e a Embrapa? Afinal, nem café, cana, laranja, soja, milho, algodão, boi, suíno ou frango são nativos. Vieram de fora e foram aqui aclimatados por nossos órgãos de pesquisa.
Em segundo lugar, há um tema muito complexo: em geral, as empresas de tecnologia agrícola estão ligadas a companhias que vendem outros insumos, como fertilizantes, defensivos, máquinas e que também oferecem crédito ao produtor. Com isso, a semente desenvolvida pela pesquisa privada faz parte de um pacote tecnológico e o produtor, de certa forma, compra tudo junto. E muitas vezes já contrata a venda da sua produção à mesma empresa ou a parceiras dela.
E isso a empresa pública não pode fazer: o papel dela é produzir a tecnologia que gera a semente. E, por conseguinte, ela perde mercado de sementes porque não tem o pacote todo.
E ainda há outro problema: a empresa pública é muito mais burocratizada. Se quebra uma colhedeira na hora de colher um experimento, por exemplo, o mesmo pode ser perdido.
Mas nada disso justificaria plenamente a privatização da Embrapa, do IAC ou do Biológico.
O que é necessário, isso sim, é flexibilizar sua gestão, agilizar as ações e, naturalmente, melhorar seus orçamentos, uma vez que todos têm excelentes recursos humanos treinados e capazes, além de boas estruturas.
E um dos melhores caminhos para isso é a parceria.
No caso da Embrapa, uma parceria perfeita seria com o cooperativismo. As cooperativas entregam o pacote tecnológico e compram, processam e comercializam a produção dos cooperados.
Com um mecanismo desses, a Embrapa -ou o IAC- ganha capacidade de competir com as empresas privadas, aliás, muito necessárias para o agro brasileiro.
Há, por fim, outra alternativa: são as Empresas de Propósito Específico (EPEs), previstas pela Lei de Inovação Tecnológica, mas, para que funcionem, é preciso aperfeiçoar a lei. Em suma: privatizações, não; parcerias, sim.
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ROBERTO RODRIGUES, 69, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura (governo Lula). Escreve aos sábados, a cada 14 dias, nesta coluna. rr.ceres@uol.com.br

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