22 de abril de 2012

Violencia na USP



‘Atos criminosos vêm acontecendo há décadas na USP’, diz reitor

SÃO PAULO. O currículo acadêmico é vasto: graduado em Pedagogia, Direito, Letras e Música, tem mestrado em Diplomacia pela Fletcher School, em Ciências Político-Econômicas pela Universidade de Coimbra e em Direito por Harvard, além de ser doutor em Direito pela USP. João Grandino Rodas, de 67 anos, era diretor da Faculdade de Direito da universidade paulista quando foi nomeado reitor pelo então governador José Serra, assumindo o cargo em janeiro de 2010. A escolha foi polêmica: Rodas era o segundo colocado numa lista tríplice elaborada após eleição junto à comunidade acadêmica. Segundo os críticos, sua indicação foi por conveniência política. Em entrevista por e-mail, o reitor da USP responde às críticas, defende a presença da polícia no campus e condena “atitudes extremistas” como forma de protesto.
O GLOBO: A presença de policiais no campus divide os alunos. Apesar de a maioria apoiar a medida, como a Reitoria lida com tantas críticas, como a de que os PMs são truculentos, revistam os alunos e impedem “práticas antigas” na universidade, como o uso de maconha?
RODAS: O convênio com a PM foi resposta ao clamor da própria comunidade da USP, em razão do assassinato de um aluno, em maio de 2011. O convênio com a polícia foi aprovado pelo Conselho Gestor do Campus, composto por mais de quarenta pessoas, incluindo representantes dos funcionários e dos alunos. Houve negociação com a PM justamente para permitir que haja na USP uma polícia comunitária, que conheça e respeite as particularidades e que interaja com a Guarda Universitária que sempre existiu no campus, mas não possui nem pode exercer poder de polícia, por disposição constitucional.
O consumo de drogas na universidade deve ser impedido? Como?
RODAS: O consumo de drogas é ilegal, em todo território nacional. A USP tem desenvolvido programas específicos de assistência e prevenção de álcool, tabaco e outras drogas.
A Reitoria está disposta a dialogar com os alunos descontentes? Eles reclamam que não são ouvidos. E há tensão entre eles, muitos não mostram seus rostos, nem dão seus nomes em entrevistas.
RODAS: A Reitoria está disposta a conversar com os alunos sobre o assunto, pois o diálogo deve ser a regra na universidade.
Há seis alunos que foram expulsos, e outros quase cem estão sofrendo processo administrativo, movido pela Reitoria, que pode levar à sua expulsão. Não é uma medida um pouco radical? Muitos réus alegam que não foram apresentadas provas contundentes contra eles...
RODAS: Tanto os processos administrativos findos quanto os em curso dizem respeito a ilícitos como invasão, vandalismo, depredação de bem público, supressão de documentos, impedimento do direito de ir e vir de professores, alunos e funcionários, entre outros. Essas ações são consideradas criminosas pelo Código Penal Brasileiro. O processo administrativo disciplinar utilizado na USP é idêntico ao usado por todos os órgãos públicos paulistas e brasileiros, respeitando a Constituição de 1988.
Estudantes e professores têm direito de se manifestar, de fazer greve? Tudo é tratado de forma democrática? Qual o limite estabelecido pela Reitoria para isso, até onde os alunos podem manifestar suas críticas?
RODAS: A melhora da universidade em todos os sentidos deveria passar por dois pontos. Primeiramente, seria proveitoso que a postura “de ser contrário a tudo” fosse substituída por postura firme de reivindicações e de colaboração, em posição de igualdade, com os órgãos administrativos. Em segundo lugar, os protestos extraordinários são cabíveis, por meio de demonstrações, etc, mas nunca com a utilização de atos que sejam criminosos, segundo o direito penal, como vem acontecendo há décadas na USP. É interessante verificar que, nos últimos anos, no Brasil, somente minorias sindicais e discentes da USP, além de outros grupos extremistas, têm usado da violência física e da destruição de bens públicos como meio de protestar. Tal tipo de protesto tem gerado antipatia geral, interna e externamente à universidade.meio de demonstrações, etc, mas nunca com a utilização de atos que sejam criminosos, segundo o direito penal, como vem acontecendo há décadas na USP. É interessante verificar que, nos últimos anos, no Brasil, somente minorias sindicais e discentes da USP, além de outros grupos extremistas, têm usado da violência física e da destruição de bens públicos como meio de protestar. Tal tipo de protesto tem gerado antipatia geral, interna e externamente à universidade.


Noventa mil alunos entre o estudo e a contestação na USP

SÃO PAULO. A Cidade Universitária da Universidade de São Paulo, a USP, ocupa uma área de quatro milhões de metros quadrados na Zona Oeste da capital paulistana. É ali onde fica a maior parte das faculdades que atendem a um total de quase 90 mil alunos, assim como a reitoria. Perto da sede administrativa, duas meninas se beijam na boca diante dos olhares constrangidos de um PM. Nos arredores da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, a FFLCH, um grupo animado e amante das teorias marxistas participa da Semana de Barba, Bigode e Baseado, dedicada “à libertação do corpo”, fumando muitos cigarros — de lícitos a inusitados como os de orégano, e também maconha. Bebendo cerveja, falam abertamente sobre experimentação sexual. Mas o que mais fazem é reclamar das políticas do reitor, João Grandino Rodas, tachado por eles de “linha-dura”.
Já no moderno prédio da FEA (Faculdade de Economia e Administração), onde Felipe Ramos de Paiva, de 24 anos, foi morto com um tiro na cabeça em maio do ano passado — incidente que levou Rodas a intensificar a presença da Polícia Militar no campus —, o clima é outro.
— Aqui, nota 5 é nota 10. Deixamos a contestação política para a FFLCH, que respeitamos. Mas somos mais realistas, sem revolução — diz Jacqueline Carvalho, de 20 anos, que cursa Engenharia Naval.
Generalizações à parte, a USP vive momentos de tensão e divisão, e os pontos de maior discordância entre os alunos são: a presença da Polícia Militar no campus, a maconha, a expulsão recente de alunos e as políticas do reitor Rodas.

Estudantes vão depor em comissão disciplinar

Para agravar o quadro, na semana passada, 79 alunos que invadiram a reitoria em novembro do ano passado para protestar contra a detenção de três estudantes com maconha foram processados e começaram a ser indiciados para depor numa comissão disciplinar, sob risco de expulsão. Além deles, outros 12 foram acusados de invadir e depredar, durante o último carnaval, o prédio da Coordenadoria de Assistência Social (Coseas), reivindicando mais espaço de moradia no Crusp. Outros seis foram expulsos após protestos semelhantes em 2010.
— Até achamos as políticas do reitor extremadas, principalmente as relacionadas à expulsão de alunos. Mas, no momento, preferimos ver policiais patrulhando o campus. Aqui, como no restante de São Paulo, há violência. Já a maconha, enquanto ela for ilegal lá fora, também deveria ser aqui dentro, apesar de o debate sobre a descriminalização ser válido — diz Beatriz Segundo, 19 anos, que cursa Engenharia Ambiental e faz parte dos 58% dos alunos da USP que, segundo pesquisa recente do DataFolha, concordam com a presença da polícia no campus.
A invasão da reitoria no ano passado e a atuação da polícia na ocasião foi um caso marcante.
— Foi horrível, parecia que estávamos numa guerra. A polícia não está aqui para evitar a violência, mas sim para vigiar movimentações políticas dos uspianos (sic). Estão militarizando a USP. Eles param o carro em vaga de deficiente, entram no quarto, fazem blitz, tentam extorquir dinheiro, é escandaloso — diz um estudante de geografia, que prefere não se identificar.
Para o tenente-coronel Ulisses Puosso, do batalhão que cuida da USP, as acusações são falsas.
— Somos obrigados a deter estudantes com droga porque a lei é clara: viciados são notificados, mas não são presos — diz o tenente-coronel, acrescentando que a “convivência com os alunos está mais pacífica” e que roubos, como os de carro, foram reduzidos em até 92%.
Durante a Semana de Barba, Bigode e Baseado, foi possível conhecer um pouco do perfil daqueles que o reitor, em entrevista ao GLOBO, considera “extremistas”. Com bom humor, Caio Andreucci, um dos organizadores, exibe — vestido de mulher — o cartaz do evento.
É comum a filiação a partidos como o PSOL e o PSTU, cuja chapa venceu as últimas eleições do DCE, bem como a grupos como o Movimento Negação da Negação (MNN), marxista. Enquanto isso, na FEA, a estudante de Relações Internacionais Cássia Mello, de 23 anos, constata: — A maioria da USP ainda quer mesmo é apenas estudar.

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