19 de abril de 2012

Violencias nas escolas: Criança algemada reacende debate sobre ação da polícia nos EUA


ALBUQUERQUE - Uma professora do Novo México pediu a uma aluna de 13 anos que parasse de conversar com outra estudante e que mudasse de lugar. A menina se recusou. A professora chamou a polícia. Dentre tantos outros casos nos Estados Unidos, este reacendeu um duradouro debate sobre a interferência policial no trato com alunos problemáticos. O caso mais recente envolve uma criança de apenas 6 anos. Num jardim de infância do estado da Georgia, Salecia Johnson foi retirada da sala de aula algemada depois de jogar para o alto livros e brinquedos durante um acesso de raiva. A polícia defendeu sua ação depois de ter sido chamada para conter o que foi classificado como tentativa de agressão ao diretor e danos à propriedade da instituição de ensino.

— As crianças estão sendo presas por serem crianças — disse Shannon Kennedy, uma advogada de direitos civis que entrou com uma ação contra a escola pública e o Departamento de Polícia do distrito de Albuquerque em favor de centenas de alunos detidos por pequenos delitos, incluindo posse de telefones celulares em sala de aula, destruição de livros de História e brincadeiras com preservativos inflados como balões de gás.
Em Milledgeville, na Georgia, uma cidade a 150 quilômetros da capital Atlanta e com 18 mil habitantes, a pequena Salecia foi acusada de jogar objetos nas paredes e atirar livros e brinquedos, na escola elementar Creekside num episódio ocorrido na última sexta-feira, mas cujo debate esquentou esta semana. Policiais afirmaram que ela teria atirado uma pequena estante na perna do diretor, e ainda saltado sobre um triturador de papel e tentado quebrar uma moldura de vidro. A polícia não informou o que causou o ataque. Superintentende das escolas locais, Geneva Braziel diz que o comportamento da estudante foi violento e que a ação dos agentes era necessária para manter a aluna, seus colegas de classe e seus professores em segurança.
Salecia foi algemada e levada numa patrulha até a delegacia. Ela foi levada a uma sala, tomou um refrigerante e não foi indiciada. Sua tia, Candace Ruff, disse ontem que a menina reclamou das algemas:
— Ela disse que machucaram seus pulsos.
A política do Departamento de Polícia é algemar qualquer pessoa que seja detida, a despeito de idade, por questões de segurança. Na Flórida, o uso da força policial nas escolas surgiu há alguns anos, quando agentes prenderam um aluno do jardim de infância que causou confusão durante um concurso. Neste ano, uma lei foi proposta para impedir policiais de prenderem crianças por pequenos delitos ou outros atos que não representem ameaças de segurança.
Advogados especializados em direitos civis e peritos em Justiça Criminal dizem que professores frustrados e diretores estão chamando a polícia com muita frequência para lidarem com tumultos de pequena importância. Mas outros educadores afirmam que a presença policial, que tem crescido em resposta às antigas políticas de tolerância dos anos 90 e a tragédias como o massacre de Columbine, é necessária para manter em segurança tanto o corpo docente quanto os estudantes de bom comportamento.
De assédio sexual em escolas elementares e médias a crianças jogando móveis para o alto, "há ainda mais desrespeito crônico e extremo, desinteresse e alunos que basicamente não se importam", disse Ellen Bernstein, presidente da associação de mestres de Albuquerque. Especialistas apontam para uma série de fatores que levam às prisões: alguns agentes estão trabalhando sem treinamento especial; administradores escolares estão desesperados para conseguir a atenção e o engajamento de pais distantes; e professores sobrecarregados não estão cientes de que chamar a polícia para resolver uma situação pode levar a sérias acusações criminais.
— É do meu conhecimento que as escolas têm confiado um pouco demais na força policial para resolver problemas disciplinares — afirmou Darrel Stephens, ex-chefe de polícia de Charlotte, na Carolina do Norte, e atual diretor-executivo da Associação de Chefes de Polícia das Grandes Cidades.
Há poucos dados nacionais sobre o assunto, e os números que poderiam informar quantas vezes a polícia é chamada para prender estudantes não é acompanhado. Algumas crianças são indiciadas e ganham antecedentes criminais em suas fichas, mas os casos variam de acordo com sua natureza e com a jurisdição; outras são liberadas, sem maiores consequências.
Em Connecticut, oficiais de justiça começaram a monitorar a prisão de estudantes: desde março do ano passado, cerca de 1.700 alunos foram detidos, quase dois terços deles por pequenas brigas e conduta desordeira. O senador John Whitmire, do Texas, diz que educadores e a polícia precisam fazer uma distinção melhor de quem eles temem e de quem eles têm raiva.
— Se você tem medo de alguém porque esta pessoa porta uma arma ou drogas, é claro que uma ação é necessária. Se são só crianças que o irritam, você não precisa tornar isso um crime.
Em Albuquerque, que começou a monitorar essas prisões depois de notar que a maioria das pequenas infrações registradas vinha das escolas, mais de 900 dos 90 mil estudantes foram levados ao sistema de justiça criminal no ano escolar de 2009 a 2010. Desses, mais de 500 foram algemados, presos e levados à detenção juvenil, segundo a polícia. Mais de 200 alunos foram detidos por ofensas menores, como conduta desordeira, resistência à prisão e recusa a ordens.
Dados preliminares indicam que o número de prisões caiu 53% desde que uma ação judicial foi impetrada em 2010, pedindo que agentes da lei tenham mais cautela. A direção das escolas de Albuquerque não comentaram os casos.
Mas advogados e pais dizem que estas primeiras prisões podem causar ainda mais problemas. Annette Montano afirma que seu filho de 13 anos foi detido na escola depois de arrotar durante uma aula de educação física. A tensão entre o menino e a direção da escola levou a outras ocorrências, incluindo uma revista íntima depois que ele foi acusado de vender drogas.
Na Geórgia, a família de Salecia disse que a menina foi suspensa da escola até o fim do ano letivo americano, em agosto.
— Não queremos ver isto acontecendo com outra criança, porque é horrível — afirmou Candace, tia da menina.

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