1 de agosto de 2012

Cenpec comenta: Mapa da Violência 2012



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Publicada: 19/07/2012

Para coordenador do projeto Jovens Urbanos, dados refletem ausência de política nacional adequada para juventude


“É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária” (Artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente).

 
Para o sociólogo Jacob Jacobo Waiselfisz, autor do estudo Mapa da Violência 2012, divulgado nesta quarta (18), o Brasil vive uma epidemia da violência contra crianças e adolescentes. Segundo o levantamento, a taxa de homicídios entre crianças e jovens com idades entre 1 e 19 anos cresceu 375,9% nas últimas três décadas. O Brasil ocupa o quarto lugar no ranking dos países com os maiores índices de homicídio contra essa população, registrando 44,2 casos a cada 100 mil jovens de 15 a 19 anos. 

 
Depois dos homicídios (43,3%), acidentes no trânsito (27,2%) são a principal causa externa de óbitos de crianças e adolescentes. O estudo indica ainda que essa população é vítima tanto de violência física (12.825 casos)  como sexual (10.425 casos), segundo número de atendimentos realizados pelo SUS em 2011. Em ambos os casos, os pais aparecem como os principais responsáveis pelas violências, seguido por conhecidos próximos (amigo ou vizinho).

 
Os números foram divulgados ainda no calor dos debates realizados durante a 9ª Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, encerrada no último sábado (14), e mostram que o ECA ainda está longe de ser plenamente efetivado. Mais do que isso, confirmam uma realidade que a maior parte da sociedade desconhece: crianças e adolescentes são na maior parte dos casos vítimas da violência e não agressores.

 
O relatório reproduz declaração do diretor executivo da Anistia Internacional no Brasil, Atila Roque, sobre os homicídios de jovens e adolescentes: “o Brasil convive, tragicamente,com uma espécie de “epidemia de indiferença”, quase cumplicidade de grande parcela da sociedade, com uma situação que deveria estar sendo tratada como uma verdadeira calamidade social .... Isso ocorre devido a certa naturalização da violência e a um grau assustador de complacência do estado em relação a essa tragédia. É como se estivéssemos dizendo, como sociedade e governo, que o destino desses jovens já estava traçado” (pág. 80).

 
“O adolescente é o responsável pela onda de violência? Porque essa é a sensação que se dissemina na sociedade: a de que eles fazem o que eles querem e não tem lei que os impeça. Mas na verdade a sociedade está dizimando os adolescentes”, observa a psicóloga Patrícia Grandino, professora da EACH-USP.


Para Célia Pecci, coordenadora do projeto Educação com Arte, que atua com jovens em privação de liberdade, há uma visão equivocada a respeito da juventude e das questões que cercam essa fase da vida. “Na nossa sociedade, tanto na escola como nas outras instituições educacionais, ainda se confunde educação com disciplina, com subalternização ou polimento, com aceitação da sociedade como ela está colocada, com a valorização da cultura das elites em oposição às culturas populares ou de periferia. E a marca da juventude é o desejo de transformar as coisas”, pondera.

 
Na avaliação de Wagner Santos, coordenador do Programa Jovens Urbanos (iniciativa da Fundação Itaú Social coordenada pelo Cenpec), cujos participantes são selecionados em regiões com altos índices de vulnerabilidade de grandes centros urbanos, os dados são reflexo da ausência de políticas nacionais adequadas para tratar tanto a questão da segurança pública como da juventude. “Falta uma intervenção nacional nesse sentido, políticas mais claras, colaborativas, modelo de inteligência mais adequado, políticas focadas para juventude e um enfrentamento claro em relação ao tráfico de drogas, um problema nacional e local”.

 
Além de não se constituir como prioridade para os governos, a juventude não faz parte da agenda nacional, nem dos programas de partido. “Quem está comprometido com processos de desenvolvimento econômico, democracia, tem que pautar essa questão nos programas e nas políticas públicas, porque, na ausência de políticas adequadas de educação, saúde, cultura, a juventude vira bode expiatório”, salienta.

 
Santos acrescenta ainda que, para além da discussão sobre o cumprimento do Estatuto, o problema deve suscitar um debate mais profundo: o da democracia que temos para a democracia que efetivamente queremos. “Como viver num Estado que se diz de direito com esses números alarmantes? Não se trata de culpabilizar setores, mas tratar a questão como uma epidemia terrível e que precisa de respostas políticas, econômicas e sociais claras. É preciso dar um sinal claro para mudar essa cultura da violência”, reitera.


Fabiana Hiromi

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