8 de agosto de 2012

Depois da euforia (IV): educação, artigo de Fabio Giambiagi

 
 
Fabio Giambiagi é economista e coorganizador do livro "Economia Brasileira Contemporânea: 1945/2010" (Editora Campus). Artigo publicado no Valor Econômico de hoje (8).

Este é o quarto artigo acerca do meu livro com Armando Castelar ("Além da euforia", Ed. Campus) referente aos problemas da nossa realidade e que serão um obstáculo para a continuidade do crescimento. Depois de um primeiro texto geral, os artigos posteriores trataram da nossa baixa produtividade e da poupança doméstica e hoje iremos abordar o tema da educação. O desenvolvimento sustentável, para além da "etapa fácil" da ocupação de capacidade ociosa e da redução da taxa de desemprego, se constrói sobre alicerces que, no Brasil, deixam a desejar - realidade essa que, se não for modificada, irá conspirar contra nosso êxito no longo prazo.

O capítulo sobre educação foi escrito por Marcio Gold Firmo, cujas informações acerca do tema são aqui sintetizadas. A tabela é um bom indicador para medir nosso atraso relativo. É verdade que entre 2000 e 2010 o número de anos médios de escolaridade da População Economicamente Ativa (PEA) no Brasil aumentou 1,1 ano. Ocorre que:

i) na década anterior, tinha aumentado 1,9 anos;
ii) na primeira década deste século, a escolaridade média se elevou também 1,1 ano nos países selecionados da periferia europeia e nos "tigres" asiáticos e em 0,9 anos nos maiores países da América Latina exceto Brasil; e
iii) no conjunto de países da tabela, em 2010 o Brasil fica muito atrás em qualquer comparação feita.

Estamos mal na foto - e o filme não chega a ser animador. O Brasil evoluiu, mas o resto do mundo também. Consequentemente, nosso atraso relativo permanece. Uma realidade similar se observa em diversos indicadores. Na nota de matemática do Programme for International Student Assessment (Pisa), hoje o melhor "termômetro" comparativo da qualidade da educação em diversos países, mesmo considerando o avanço recente, ficamos atrás não apenas dos países desenvolvidos, mas também de países como Argentina, México, Chile, Uruguai e também atrás de Rússia, Sérvia, Turquia e Cazaquistão. No mesmo PISA, em 2009, o percentual de alunos com desempenho abaixo do adequado em matemática foi de 8% na Coreia do Sul, 22% na média dos países da OCDE, 23% nos EUA, 30% na Grécia, 42% na Turquia e constrangedores 69% no Brasil. Nos exames do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB), o percentual de alunos com desempenho em Matemática considerado adequado à sua série já é baixo no 5º ano do Ensino Fundamental (apenas 33%) e cai ainda mais, para apenas 15%, no 9º ano e para 11% no 3º ano do Ensino Médio.

Alguém poderia alegar que o problema é de escassez de verbas. Essa é uma questão controversa, mas objetivamente: a) o gasto em educação no Brasil passou de 3,9% para 5% do PIB entre os anos de 2000 e 2010; e b) neste último ano, o gasto em educação no Brasil como fração do PIB, pelos dados da OCDE, era maior do que nos EUA e do que a média da OCDE, além de ser também superior ao de Polônia, Holanda, Canadá, Espanha, Coreia do Sul, Alemanha, Austrália, Chile e Japão.

Parte do nosso atraso vem de longa data e resulta da opção que as elites dirigentes fizeram há décadas ao adotar um modelo fortemente concentrador de renda e com escassas preocupações com a melhora de oportunidades para os filhos das famílias mais humildes, através da priorização da educação. A Coreia do Sul fez exatamente o contrário a partir dos anos 50, com resultados espetaculares.

Parte do problema, porém, deriva de escolhas recentes, como aquelas associadas a certo tipo de ensino voltado para a formação do cidadão, em oposição à priorização do aprendizado de matemática e português. Sem uma base forte nessas disciplinas, é impossível esperar que o aluno tenha um bom desempenho nas demais. Cabe destacar, como um bom sinal, o empenho do setor privado e da academia em favor do avanço da avaliação da eficácia de diferentes tipos de intervenções educacionais, a despeito da resistência de parte do setor de educação pública. É imperativo que os governos assumam o papel de multiplicadores das experiências inovadoras de sucesso.

Na educação, o Brasil tem hoje uma atitude oposta à que assume no futebol, no qual o segundo lugar é visto como uma derrota. Comparativamente, a autocongratulação em relação aos resultados educacionais de nossas crianças e jovens é de uma complacência inadmissível. Aspirar a um crescimento sustentável de 5% ao ano, desse jeito, é apenas um sonho.

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