19 de agosto de 2012

Os colegiais estão nus

Gazeta do Povo, PR, 19/8/2012

A escola para eles pode ser uma tormenta. Ali se pratica um currículo sem serventia. É provável que não estejam de todo certos, mas os jovens mandam sinais de fumaça de que estão insatisfeitos com a educação. O Ideb 2011 que o diga
O ano de 2012 pode ser aquele em que o Brasil finalmente acordou para um de seus maiores dilemas os maus bofes do ensino médio. Os números do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, o Ideb, recém-divulgados pelo Ministério da Educação, fizeram a bomba explodir dentro da lata. Houve estrondo. É nos três anos entre o ensino fundamental e o ensino superior que o país põe a perder seus esforços na construção de uma boa rede de aprendizagem. Mudar o rumo dessa história é que são elas.
A debilidade do ensino médio não é assunto recém-chegado à pauta da educação, mas foi se perdendo pelas bordas na última década. Nesse tempo todo, a soma de esforços se deu no sentido de garantir que todas as crianças de 1.ª a 5.ª série estivessem na escola, o que teve efeito em cadeia sobre as séries seguintes. Atingiu-se um resultado de encher os olhos. Mas se distrair do destino dos adolescentes foi negligência passível de palmatória e castigo, pois em torno desse grupo se aninham dilemas que inviabilizam o país da drogadição à evasão escolar. Nossos jovens estão nus.
Justiça seja feita, o governo federal deu pistas de que iria se coçar. As ações da Secretaria Nacional da Juventude e programas como o Pro-Jovem entre outros apuraram dados, promoveram oficinas e permitiram ver o quadro-negro dos nossos moços sem escola ou ligados a escolas ruins. O poder público foi ora seguido, ora alavancado pelo movimento social. Deve-se destacar, por exemplo, a contribuição do Índice de Desenvolvimento Juvenil, o IDJ, criado pela Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana, a Ritla.
O documento da Ritla mostrou que a juventude não é a tal da banda na propaganda de refrigerantes, mas o grupo mais vulnerável à violência, em especial no trânsito e no tráfico, e que tem relações cristalíssimas com o mercado de trabalho e com a escola podem quebrar. E quebram. O IDJ, deve-se dizer, ajudou a sociedade a pensar as feridas expostas da população jovem, a exemplo de pesquisa de 2008 do Datafolha e dos estudos deMiriam Abramovay, outro marco dessa década em que a mocidade ocupou as melhores cabeças. Diante do Ideb, resta perguntar onde é que se errou.
Parte da resposta está na própria mecânica das políticas públicas, que falham ao engrenar o trabalho em sala de aula com os giramundos da sociedade em geral. Em miúdos, o grau de reflexão sobre os jovens e o ensino médio avançou, mas não conseguiu abalar as práticas pedagógicas, forçando-as a se reinventar. Nem uma nem duas pesquisas ao longo desses tempos de Ideb, Enem, Prova Brasil e ProUni mostraram que os adolescentes se desinteressam pela escola por não saberem para o que serve o que estudam em sala de aula. E que bem tentam voltar aos bancos escolares, mas se perdem à beira do caminho. A escola para eles é uma tormenta. O futuro também será.
A estagnação do ensino médio, ostentada pelo Ideb, parece confirmar a dificuldade em falar a esse grupo. A avaliação estacionou em uma nota ruim 3,4. O governo agora se apressa em apresentar uma nova proposta curricular, o que dá medo, pois educação não é montadora de automóveis, movida a IPI baixo. Serão águas furtadas se não houver um debate nacional. Estamos lidando, afinal, com o maior sistema de fracasso do país, posto que só 25% dos que ingressam no primeiro ano do ensino básico chegam ao último ano do ensino médio.
Deveria servir de modelo o movimento, nos anos 90, que debateu nacionalmente a aplicação da pedagogia histórico-crítica , cimentando novas práticas de ensino. Não a implantou, mas gerou novos pactos. Agora, o primeiro passo é entender por que cargas d água, como manifestou a educadora Paula Lozano, da USP, os avanços conseguidos nos anos anteriores da escolarização não têm efeito nos anos finais. Repete-se no ensino o mito de Sísifo, derrubando sempre as mesmas pedras carregadas ladeira acima. Os jovens são o melhor indício de que as pedras rolaram outra vez. Hora de recolhê-las, juntos.

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