14 de dezembro de 2015

Em apenas dez anos, população de 5 a 9 anos caiu 16%. País precisa saber como aproveitar esta oportunidade



POR ANTÔNIO GOIS
A forma desastrada e pouco transparente com que o governo de São Paulo tentou impor sua proposta de reorganização e fechamento de algumas escolas gerou forte reação de alunos, famílias, professores e movimentos sociais. De início, a ideia foi apresentada como uma maneira de melhorar a qualidade do ensino, separando escolas por ciclos. A tese pode até ser verdadeira, mas o estudo que baseou a tentativa de mudança não era robusto o suficiente para convencer a comunidade escolar e especialistas em educação. Aos poucos, ficou claro que a reorganização tinha também o objetivo de racionalizar o atendimento e diminuir custos.
Tudo que aconteceu em São Paulo, porém, joga luz sobre um fenômeno que não pode ser ignorado pelo sistema escolar: num intervalo de apenas 10 anos, a população de 5 a 9 anos no país teve uma queda de 16%, segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE. Em 2004, havia 17,5 milhões de brasileiros nessa faixa etária, número que caiu para 14,6 milhões em 2014, ou quase três milhões de crianças a menos.
População de 5 a 9 anos de idade no Brasil
Em alguns estados, essa redução tem acontecido, proporcionalmente, num ritmo ainda maior. No Rio, por exemplo, no mesmo período, a queda da população nessa faixa etária foi de 19%.
As projeções populacionais do IBGE indicam que essa tendência de diminuição no número de nascimentos vai continuar, ininterruptamente, pelas próximas décadas. De 2015 até 2060, a população nessa faixa etária terá caído 40% em números absolutos.
Projeção da população até 2060

A explicação para esse fenômeno é que o país já apresenta taxas de fecundidade inferiores ao patamar que indica mera reposição populacional, de 2,1 filhos por mulher. Em sua última Síntese de Indicadores Populacionais, divulgada no início do mês, o IBGE calculou que o número médio de filhos por mulher já estaria em 1,7, similar ao verificado hoje em países como a Holanda ou Dinamarca (alguns pesquisadores trabalham com uma taxa maior, mas ainda assim abaixo do nível de reposição).
Com menos crianças a serem atendidas, temos uma oportunidade de ampliar o investimento por aluno, com ações que tenham impacto positivo na qualidade do ensino. Um exercício feito pelos pesquisadores Barbara Bruns e Javier Luque no livro Professores Excelentes, do Banco Mundial, estima que, mantendo a média atual de alunos por professor, o país conseguiria aumentar em 37% o salário médio dos professores até 2025. A lógica é simples: se há menos crianças, serão necessários menos professores, que poderão ter rendimentos maiores. O número menor de alunos também facilita a tarefa de ampliar o número de escolas em tempo integral, meta que consta do Plano Nacional de Educação. Não há como fazer essa transição, porém, sem alterar a rotina de famílias. Uma escola que atende menos alunos e funciona em três turnos, por exemplo, se for transformada em uma unidade de tempo integral, atenderá menos crianças, e algumas precisarão ser transferidas para outros estabelecimentos.
No mundo ideal, em que dinheiro não é problema, poderíamos nos dar ao luxo de fazer tudo ao mesmo tempo: melhorar a infraestrutura escolar, ampliar a jornada, pagar melhor os professores e diminuir o tamanho das turmas sem grandes mudanças na organização das escolas no país. Até onde a vista alcança, porém, nosso cenário econômico não dá margem para otimismo, ainda mais depois da queda dos preços do petróleo e diminuição do potencial do pré-sal, fontes que, até bem pouco tempo, alimentavam nossos sonhos educacionais.
O lado positivo é que o cenário demográfico está jogando a favor, mas ele, sozinho, não garante o salto de investimentos que resultem em melhoria da qualidade que almejamos. Será preciso mais dinheiro, mas o país precisa também saber o que fazer com ele diante desta oportunidade, pensando sempre em favor dos alunos, e debatendo as mudanças, de forma transparente, com todos. Esperar que essas transformações se adaptem naturalmente à realidade que temos hoje não é uma boa escolha.

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