11 de julho de 2016

Base curricular tem detalhes demais e lhe falta melhor visão do estudante’













11 Julho 2016 | 01h30


FOTO: SIMONE MARINHO

Simon Schwartzman, estudioso da área, vê o MEC inchado de programas e sem controle de seus resultados e diz que desafio hoje não é de acesso à educação, mas à educação de qualidade

O Brasil está entre os piores nas avaliações internacionais sobre educação, suas universidades vêm perdendo posição nos rankings, temos um Ministério da Educação inchado de programas sem saber se eles justificam seus custos, e ainda sofre da precária má formação de professores. “E se o professor não transmitir valores, não serão o currículo nem os computadores que o farão.”
O cenário e a frase são do cientista político Simon Schwartzman, mineiro de Belo Horizonte que já presidiu o IBGE e que hoje está no Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade no Rio de Janeiro, Iets. Um dos mais respeitáveis pensadores da educação no País há várias décadas, Schwartzman dispensa apresentação. Nesta entrevista a Gabriel Manzano, ele comenta uma famosa frase de FHC segundo a qual “o Brasil não gasta pouco, ele gasta mal”. E acrescenta: “Isso é hoje mais verdadeiro do que nunca”. O problema principal no País, diz, “não é mais a desigualdade no acesso à educação, mas sim a desigualdade no acesso à educação de qualidade”. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Como avalia hoje, em tempos de governo e ministro interinos, os limites e desafios imediatos da educação brasileira?
O ministro Mendonça Filho é um administrador experiente e formou uma equipe com pessoas altamente competentes, liderada pela secretária executiva Maria Helena Guimarães Castro. O novo grupo de trabalho encontrou um ministério inchado, com orçamento de mais de R$ 40 bilhões de reais – um dos maiores –, e um sem número de programas que vinham crescendo e se expandindo sem se saber se os resultados compensam os custos – como Ciência sem Fronteiras, Pronatec, Fies e as isenções fiscais associadas ao ProUni. Apesar dos cortes recentes, o ministério, aparentemente, não tem problema de dinheiro e poderia fazer muito mais se os recursos fossem bem utilizados.
O que ele pode fazer para melhorar?
Se for possível, nos próximos dois anos, definir com clareza as prioridades de investimento, avançar na reforma e diferenciação do ensino médio, criar um sistema adequado de formação de professores e lidar corretamente com o tema da Base Nacional Curricular. Com isso, terá dado grande contribuição.
A educação brasileira tem tido uma contínua queda nos rankings internacionais. Dá para mudar isso no médio prazo?
De fato, as poucas universidades brasileiras que aparecem nos rankings internacionais – USP, Unicamp, UFRJ, UFMG, UFRGS – vêm perdendo posição, mas o mais significativo é que nenhuma delas está entre as 100 melhores do mundo, e todas as demais estão muito abaixo ou nem aparecem. Mais sério ainda é que o Brasil está entre as piores posições na avaliação do Pisa, da OECD, que mede o desempenho de jovens de 15 anos em linguagem, matemática e ciência – e essa posição quase não tem se alterado ao longo do tempo. Apesar de os gastos públicos por estudante na educação fundamental terem triplicado entre 2004 e 2013, a qualidade da educação medida pelo Saeb, organizado pelo MEC, permanece em níveis muito baixos. Infelizmente, não há uma fórmula ideal, nem bala de prata, para resolver tal situação. Tudo em educação é controverso, mas existe hoje, entre os especialistas, um consenso claro sobre coisas que devem ser feitas nos diversos níveis da educação. Mas elas não são implementadas porque há muita resistência e os governos não querem pagar o custo político de mobilizações contrárias.

O sr. vê caminhos, no médio prazo, para se reduzir a desigualdade no acesso à educação? Vale a antiga afirmação de FHC de que o Estado não gasta pouco, mas gasta mal?

A afirmação de FHC é hoje mais verdadeira do que nunca. Muitos estudos, no Brasil e no mundo, mostram não haver na educação uma relação clara entre o que se gasta e os resultados obtidos. O problema principal da educação brasileira há muito tempo não é mais de desigualdade de acesso, e sim de desigualdade no acesso à educação de qualidade. As famílias mais educadas e com mais recursos põem seus filhos em escolas particulares ou escolas públicas seletivas, e as mais pobres os colocam nas escolas estaduais e municipais mais perto de suas casas, que, com poucas exceções, funcionam mal. Mas há exemplos de que é possível ter boa educação em escolas públicas se elas forem bem organizadas, tiverem uma liderança capaz de tornar os professores comprometidos com a aprendizagem dos alunos, e usarem métodos e materiais pedagógicos de qualidade. Isso requer secretarias de educação competentes e livres de interferência política. Infelizmente, poucas redes escolares no Brasil atendem a estes critérios.

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