3 de outubro de 2016

MARIA ALICE SETUBAL: Por que discutir a reforma do ensino médio?



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Estudos e pesquisas sobre o ensino médio e juventude apontam, de forma recorrente, a falta de interesse dos estudantes pela escola, a defasagem entre o ensino escolar e a realidade cotidiana dos jovens, o excesso de disciplinas e a baixa qualidade da educação demonstrada pelos indicadores educacionais. Todos esses fatores indicam a necessidade de mudanças profundas nessa etapa da educação básica.
A ampla repercussão do anúncio do Ministério da Educação sobre a reforma do ensino médio na mídia, com manchetes nos principais jornais do país e noticiários da TV, parece sinalizar que há um consenso na sociedade sobre a importância da educação para o futuro do país.
Ao mesmo tempo, o fato de a reforma ter sido lançada por meio de medida provisória denota a distância entre o tempo da política e o tempo necessário para que a sociedade conheça, discuta e se aproprie das mudanças na educação.
As manifestações de rua e nas redes sociais revelam um anseio por participação e protagonismo por parte dos diferentes setores da sociedade, especialmente os jovens. Teorias de mudanças enfatizam a importância de se construir uma visão compartilhada entre os envolvidos a partir do engajamento de todos, das secretarias de educação às escolas.
políticas públicas, o maior tempo para partida pode significar, na maioria das vezes, maior efetividade e eficácia na implementação e no alcance de resultados. Embora muitos desejem ter uma bala de prata que resolva os problemas e garanta melhores resultados, há sempre diferentes dimensões a serem consideradas na educação.
A flexibilização do currículo, com opção para diferentes percursos formativos, precisa considerar aspectos fundamentais na sua implantação, sob o risco de aumentarmos as já enormes desigualdades educacionais. Estratégias para o enfrentamento dessa questão não foram apontadas na medida provisória.
Outra dimensão ausente na proposta diz respeito ao apoio federal para que as redes de ensino melhorem a infraestrutura das escolas, com instalação de bibliotecas, laboratórios, computadores com internet e wi-fi, quadras esportivas.
No âmbito pedagógico não há medidas para enfrentar a baixa qualidade do ensino noturno, que atende a 23,6% dos alunos brasileiros, conforme Censo Escolar de 2015. Como viabilizar percursos formativos para esse turno?
A Base Nacional Comum Curricular ainda demanda uma discussão ampla e profunda com a participação dos diferentes segmentos da educação, incluindo os estudantes, e da sociedade, para que possamos ter mais clareza sobre as disciplinas obrigatórias e as opcionais das quatro áreas do conhecimento.
Finalmente, vale aprofundar a discussão sobre recursos. Sem dúvida, as escolas que implantaram educação integral têm alcançado bons resultados. No entanto, fica a questão: por que o MEC optará por destinar mais recursos apenas para as escolas que ampliarem a jornada escolar?
A flexibilidade do currículo, assim como a diversificação das ofertas dentro de uma mesma rede, pode ser promissora, desde que se garanta um patamar básico de qualidade para todas as escolas.
Secretários de Estados que enfrentam graves dificuldades financeiras já anunciaram que não terão condições de implementar a reforma.
Obviamente, não se trata apenas de mais recursos mas também de uma gestão, tanto das secretarias como das escolas, mais responsável e comprometida na busca por resultados, com a melhoria da infraestrutura e a formação de seus professores.
MARIA ALICE SETUBAL, a Neca, doutora em psicologia da educação pela PUC-SP, é presidente dos conselhos do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária - Cenpec e da Fundação Tide Setubal. Foi assessora de Marina Silva, candidata à Presidência em 2014

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