29 de agosto de 2017

Escolhas, Antonio Gois


POR ANTÔNIO GOIS
Estudo mostra que professores com maiores notas em concursos tendem a evitar escolas em áreas mais pobres, justamente onde os alunos mais precisam

Na teoria, poucos discordam que os alunos que mais precisam devem ter aulas com os melhores professores. Na prática, porém, fazer com que o sistema de ensino caminhe nessa direção exige um esforço enorme das políticas públicas. Já citei aqui na coluna estudos que mostram que, mesmo dentro de uma mesma escola, a tendência mais comum são professores mais experientes escolherem as turmas que darão aulas, o que induz naturalmente a uma opção por aquelas menos desafiadoras. Mas o problema não ocorre apenas dentro de uma unidade de ensino. Ele começa já desde o momento de contratação dos profissionais por concurso.
Num estudo apresentado há dez dias na IX Reunião da Associação Brasileira de Avaliação Educacional, o pesquisador Leonardo Rosa, da Universidade Stanford, analisou as preferências de professores aprovados num concurso público para a rede municipal de São Paulo em 2010. Assim como ocorre na maioria das cidades e estados no Brasil, candidatos com melhor pontuação têm prioridade na escolha do local onde darão aula. O resultado, compatível com o que sabemos por estudos internacionais, foi que profissionais mais bem colocados no concurso evitavam escolas que atendiam crianças mais pobres, localizadas em áreas mais vulneráveis, e com piores resultados em testes de aprendizagem.
O resultado pode parecer óbvio, mas é relevante em primeiro lugar porque nem sempre estudos em educação confirmam o que se esperaria do senso comum. Leonardo Rosa, porém, identificou também que professores preferem escolas localizadas em áreas onde há outras escolas ao redor, o que pode estar relacionado com o fato de quererem (ou precisarem) dar aulas em mais de um estabelecimento.
O estudo também investigou se o pagamento na época de um bônus de 5% a 7% no salário dos professores que escolhessem escolas mais vulneráveis em São Paulo era capaz de alterar esse padrão. A pesquisa mostrou que o benefício não estava fazendo o efeito desejado, provavelmente devido ao valor muito baixo para compensar o deslocamento e o maior desafio de dar aulas numa área mais vulnerável.
O problema não é restrito a São Paulo, nem ao Brasil. Em cidades com alta desigualdade e que enfrentam o drama da violência urbana, porém, o desafio é certamente maior. Basta ver o caso das escolas do Rio em áreas com alto índice de confrontos armados. Salário, apenas, não será suficiente para atrair e reter os melhores professores nessas escolas e, mais uma vez, os maiores prejudicados com isso são os alunos que mais precisam.
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A pesquisa de Leonardo Rosa traz também um outro dado que merece reflexão. No concurso de 2010, analisado em sua pesquisa, ele mostra que de 65 mil candidatos no concurso de professores, apenas 6% (4.205) foram considerados aptos a se candidataram a uma das 6.336 vagas oferecidas em escolas. O problema é ainda maior em algumas disciplinas, caso de matemática, onde este percentual dos aprovados em relação aos inscritos no concurso cai para 3%. Em quase todas as disciplinas, faltaram candidatos aptos a preencherem todas as vagas oferecidas, o que pode indicar tanto um problema na formação de professores quanto no formato do concurso público. 
 

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